Disrupção Digital no Marketing e Comunicação
ERA UMA VEZ, HÁ MUITO MUITO TEMPO, NUMA TERRA MUITO MUITO DISTANTE…
… O João, que acorda com o toque do despertador e vai buscar o jornal diário à caixa de correio, que lê religiosamente enquanto toma o pequeno-almoço. O João vai então para o trabalho e aproveita para dar boleia à sua filha Sofia, que arranjou um part-time numa famosa cadeia de vídeo clube. O gosto pelo cinema e música já é de família, visto que o João é o responsável de marketing de uma grande cadeia de lojas de venda de discos, que está prestes a lançar o novo álbum de uma popular banda. O João decidiu avançar com um spot publicitário para o lançamento do disco, que vai passar entre o telejornal e a telenovela assegurando assim que é visto pela maioria da população. Depois de adjudicar a produção à sua agência através do envio de um fax, o João aproveita a hora de almoço para ir depositar uns cheques ao Banco. Felizmente existem vários balcões do seu Banco nas proximidades do escritório, e apesar de ter perdido algum tempo na fila, ainda tem tempo de ir pôr a revelar os rolos de fotografias das últimas férias…
Esta história, que era uma realidade há não muito tempo e numa terra bem próxima, podia continuar com diversos exemplos de partes da nossa vida que foram totalmente alteradas pela revolução digital. Hoje, acordamos com o som do smartphone e é através dele que consultamos as notícias de manhã. Já não existem vídeo clubes nem lojas de discos tendo esses negócios sido totalmente revolucionados pela desmaterialização dos conteúdos e pelo surgimento de empresas como o Netflix ou o Spotify. O email substituiu o fax e os serviços de Internet e Mobile Banking têm vindo progressivamente a substituir os Balcões. E 99 % das fotografias que são tiradas, nunca chegam a ser impressas.
O ritmo de inovação é avassalador, o que coloca fortes desafios a quem trabalha nas áreas de marketing e comunicação
De facto, a Internet tem vindo a provocar uma das maiores revoluções da história da humanidade. Nunca antes a sociedade humana sofreu tantas transformações num tão curto espaço de tempo, como no período desde o virar do milénio. A forma como trabalhamos, como comunicamos, como nos informamos e como nos entretemos, mudou radicalmente nos últimos anos, muito por via da entrada do digital nas várias componentes da nossa vida.
Várias estatísticas suportam esta tese de transformação a uma velocidade nunca antes vista: enquanto a rádio levou 38 anos a chegar a 50 milhões de pessoas, o Facebook necessitou de apenas 3 anos e o popular jogo online Angry Birds de apenas 35 dias. Dentro da revolução digital está a ocorrer a revolução mobile, com a afirmação do smartphone como dispositivo vencedor. O smartphone está a tornar-se num prolongamento do organismo humano, sendo o primeiro objeto que utilizamos quando acordamos e o último antes de nos deitarmos. Está progressivamente a substituir outros objetos do nosso dia-a-dia como o despertador, o relógio, a agenda, a máquina fotográfica, o jornal, a rádio, o PC e a TV. É o único dispositivo que levamos para todo o lado, sendo que 79 % das pessoas indicam que ficam em stress emocional profundo se forem afastadas do seu smartphone.
Neste novo mundo conectado e sempre online, o ritmo de inovação é avassalador, o que coloca fortes desafios a quem trabalha nas áreas de marketing e comunicação. A regra base do marketing de enfoque no consumir mantém-se, mas este novo consumidor multifacetado e em constante mutação obriga a um estado de permanente alerta e adaptação.
Fenómenos como o mobile, as redes sociais e o consumo não linear de tv (time-shift) colocam em causa as técnicas tradicionais de comunicação para atingir o público-alvo. A publicidade através de meios como a TV, Rádio, Imprensa ou Outdoors continua a ser fundamental, mas hoje os profissionais de marketing e comunicação têm de dominar técnicas como SEO, SEM, Display, Retargeting, Affiliates, Programmatic, entre outras.
Para além de uma complexidade acrescida, estes novos meios e técnicas digitais também trazem grandes vantagens como permitirem uma recolha de informação sem precedentes, com um enorme potencial para ser trabalhada permitindo melhorar os produtos e serviços, customizando as soluções às necessidades de cada consumidor. O marketeer moderno tem assim adicionalmente de ter competências analíticas e dominar temas como Big Data, IoT, Predictive Marketing, Customization, Design Thinking, Customer Journey e Customer Experience. Os negócios de sucesso da era digital tiram partido do potencial dos dados de modo a proporcionarem uma experiência de excelência, com uma interação simples, personalizada e focada no cliente.
Mas mesmo assistindo à multiplicação de meios e formas de distribuição, o rei da comunicação continua a ser o conteúdo. As pessoas são bombardeadas com inúmeras mensagens por inúmeros meios, a toda a hora e em qualquer lugar, pelo que a competição pela atenção de cada indivíduo nunca foi tão feroz. O cérebro humano processa uma imagem 60.000 vezes mais depressa que um texto, pelo que a tendência é o aumento da utilização de elementos gráficos na comunicação. Uma imagem vale por mil palavras, mas um vídeo provoca o dobro do envolvimento que uma imagem. E um vídeo em direto, 5 vezes mais envolvimento que um vídeo gravado. A partilha de vídeos, que já ocupa uma posição de destaque nas redes sociais, nomeadamente via mobile, vai ser exponenciada pela partilha de vídeos de realidade virtual em tempo real, que está prestes a passar de virtual a realidade. Estima-se que 74 % do tráfico Internet em 2017 será em consumo de vídeo, estando as marcas a apostar em iniciativas de transmissão em direto de eventos como concertos ou desfiles de moda, com acesso aos bastidores e a testemunhos em tempo real dos protagonistas. Os anunciantes estão a ajustar-se rapidamente e a forma de publicidade que registou o maior crescimento de investimento em 2015 foi o vídeo mobile.
Independentemente do formato, numa época em que o consumidor tem todas as alternativas do mundo no seu smartphone, o fundamental continua a ser ter conteúdos de elevada qualidade, que sejam originais, que contem uma história envolvente, e acima de tudo, que sejam relevantes para a pessoa em causa. Sim, para a pessoa, pois apesar de a comunicação estar cada vez mais complexa e tecnológica (em 2017 os departamentos de marketing gastarão mais em IT do que os departamentos de informática), nunca nos poderemos esquecer que comunicamos para pessoas.
O fundamental continua a ser ter conteúdos de elevada qualidade, que sejam originais, que contem uma história envolvente, e acima de tudo, que sejam relevantes para a pessoa
em causa
… Retornando à história do início deste artigo, o João, entretanto reformado, tornou-se um amante pela descoberta de novas culturas e gastronomias. Para tal, utiliza uma app mobile que disponibiliza uma comunidade de pessoas que cozinham e servem refeições nas suas próprias casas. Ao chegar a uma nova cidade, o João pesquisa os tipos de comida caseira disponível, consulta avaliações e preços, tendo uma alternativa aos tradicionais restaurantes, mais autêntica e com uma maior imersão com as pessoas e cultura local. A sua filha Sofia, que deixou o part-time no clube de vídeo e tirou um curso de webdesign, trabalha na startup que criou a referida app, como user experience specialist. A Sofia não é proprietária de uma casa nem de um carro, vive num apartamento arrendado com amigas e vai para o trabalho através de um serviço de car sharing. Nunca comprou um disco ou um jornal, mas tem no seu smartphone todas as músicas e feeds de notícias do mundo…
FIM
Fim? Ainda vamos só no início…